Orgulho

Orgulho é uma palavra que tem várias interpretações.  Pode expressar um sentimento positivo, como também pontos negativos, quando se trata de discriminação.

Tivemos na nossa família um exemplo muito feio referente a orgulho.

Minha bisavó paterna, chamada Amanda, foi uma pessoa de muitas posses, tendo sido proprietária de fazendas, e naquela época contava com escravos a seu serviço.

Seu orgulho era desmedido.  Ela se sentia enojada quando era o dia do “Beija Mão”, e se “desinfetava” do contato físico com seus escravos.

Mas no fim de sua vida, arrependeu-se de suas maldades.  Pediu que quando morresse fosse carregada por cinco de seus escravos e enterrada na porta principal do cemitério para que todos  a pisassem.

Essa é uma história famosa na família de meu pai, e se contava também que meu avô paterno, filho dessa senhora, adolescente na época de sua morte, nunca mais entrou no cemitério pela frente para não pisar sobre o corpo da mãe.  Ele pulava o muro lateral.

Meu avô ficou adulto, casou-se e teve  seus filhos, entre eles meu pai.

Como fui a primeira neta, meu avô, que era homem muito bom, pediu aos meus pais que  me dessem o nome de sua mãe.  A principio, minha mãe ficou apreensiva, com receio de que o nome pudesse exercer má influência sobre mim.  Ele não tinha podido dar o nome de sua mãe a nenhuma de suas filhas. Minha avó não aceitava.

Mas meus pais acabaram cedendo por amor a ele.

E minha educação, em função desse fato, foi dirigida para que eu crescesse sem o mínimo orgulho e aprendesse a nunca maltratar os menos afortunados pelo destino.

Nunca me dei mal por isso.

No entanto, as irmãs de meu pai cresceram cultivando um tremendo orgulho, e  mesmo com a família em grandes dificuldades financeiras, se recusavam a trabalhar. Passaram toda a sua vida lutando contra a maré, tentando sobrenadar, sem grandes resultados.

Já a família de minha mãe, que não dispunha de grandes recursos, se dedicou ao trabalho, conquistou o sucesso financeiro para uma vida estável, dando instrução aos filhos que chegaram, mudando assim o rumo de suas vidas, numa atitude digna de outro tipo de orgulho.

O orgulho “bom” vem do sentimento de realização de alguém que nos é querido, pelos seus resultados, seus feitos numa batalha, as boas notas de nossos filhos na escola ou na sua profissão já na idade adulta.

Nos orgulhamos de um amigo ou de um familiar que conquistou o sucesso naquilo que se propôs fazer, que recebeu um prêmio regional ou mundial, que foi reconhecido por uma pesquisa importante para o mundo, e outras situações cuja característica é sempre de reconhecimento de capacidade, seja em que área for.

Um filho agradecido e competente é mesmo algo de que temos que nos orgulhar.

Uma amiga querida se emocionou muito com a frase de seu  jovem e eficiente filho que está vencendo na vida: “Mãe, estou dando meu sangue no trabalho pois você e meu pai trabalharam e trabalham muito para nos dar um futuro bom, e por isso quero dar o meu melhor em agradecimento a vocês”.

Isso é motivo de muito orgulho, do bom, o único que deveríamos ter.

Já pessoas orgulhosas, no mau sentido, como foi minha bisavó, que fazem pouco de quem sabe menos, de quem tem menos ou de quem realiza  menos, são fracas e, na maioria, inseguras.

Precisamos reconhecer que os que não conseguiram sucesso em qualquer setor da atividade humana,  muitas vezes não tiveram como reverter essa situação, pois talvez não tenham sido aquinhoados com o mesmo teor intelectual ou a mesma oportunidade e os recursos de outros.  Temos que compreender e não vitimá-los ainda mais.

Conheço pessoas que, por infortúnio que pode acontecer a qualquer um de nós, perderam sua independência financeira, se dedicaram a trabalhar sem nenhum complexo, trauma ou drama, sem orgulho ou soberba.  Assim, se reinventaram, obtendo novamente o sucesso merecido através da perseverança.

Isso é razão de orgulho, do bom.

Infelizmente, nesse caso, alguns amigos orgulhosos se distanciaram deles, o que não foi grande perda, pois ganharam novos amigos que demonstraram solidariedade e uma amizade sincera e não se preocupavam em avaliar somente a sua conta bancária.

Com muito orgulho, deixo aqui meus cumprimentos aos lutadores e sobreviventes a situações  difíceis.

Um grande abraço e bom domingo,

Amanda

Publicado em julho 22, 2012, em Inteligência Social e marcado como , . Adicione o link aos favoritos. 12 Comentários.

  1. Beatriz Cajango Amaral

    Adorei o texto! Beijo carinhoso

  2. Amandíssima querida, é sempre bom rever a história da sua biza;mas garanto que ela está de alma lavada,com a bisneta,que ela não conheceu,mas que está “vendo”,por tudo que vc faz.Beijos,saudades,Lúcia Cola.

  3. Querida Amanda
    Fiquei realmente emocionada com o teu texto.
    Aceitei com muito orgulho os teus cumprimentos aos
    lutadores .Voce sabe que sou uma lutadora , com vitórias e derrotas , mas sempre seguindo em frente
    com fé , esperança e coragem.
    Obrigada amiga pela tua sensibilidade .
    Vera Sayao

  4. Querida Amanda, seu texto está muito bom. Entretanto, para minimizar qualquer julgamento que se faça de sua avó e de suas tias, temos o dever de inserí-las à época em que viveram. Para aquela sociedade, de ascendência portuguesa e católica, era indigno que as mulheres de classe alta trabalhassem. Havia também o péssimo exemplo que a Igreja dava, quando não permitia que os escravos frequentassem as cerimonias religiosas, alegando que não possuíam alma. tanto que, conforme sua narração, sua avó no final da vida se arrependeu. O arrependimento veio com a maturidade que a libertou de muitas amarras impostas por aquela sociedade patriarcal. E, sob este prisma, pode-se considerar que sua avó tornou-se uma grande mulher, pois teve a coragem de mudar seus julgamentos quando os considerou falhos. Em homenagem a ela, seus restos mortais deveriam ser transferidos para outro local.Bjs Regina

  5. E com certeza, essa sua amiga da qual falou do filho, orgulha-se muito tambem, em te-la como amiga e familia! beijos no seu coracao, Fatima Frias

  6. Adorei Amanda. Gosto muito de ler seu blog por usar fatos pessoais, tornando-se muito facil entender sua mensagem, seu ponto de vista de situações reais que todos nós conseguimos ‘relate to’.
    Nesse, mais ainda por conhecer sua história.
    Todo carinho,
    Claudia xx

  7. Marietta Bystedt

    Que linda tu historia de vida, Amanda !
    Es un privilegio y un orgullo muy grande tener una amiga tan coherente y equilibrada como tu.
    besos
    Marietta Bystedt

  8. Orgulho bom para quem te conhece!!!!!!
    Linda história, parabéns à memória de sua antepassada Amanda, que mesmo iludida pelas diferenças sociais pôde ainda aqui na vida terrena arrepender-se dos seus equívocos.
    Felizes os que alcançam a compreensão em tempo necessário
    para deixar boas sementes aos seus descendentes, afinal somos todos continuação das nossas raízes.
    Felizes também os que não se deixam hipnotizar por nenhum dos acontecimentos nefastos.
    Aos que perdem amizades por conta do orgulho ruim, deixo aqui uma frase que meu avô dizia: “Amigo que não presta e faca que não corta que se perca pouco importa”.
    Muito obrigada!
    Abraços.

  9. que visão boa da vida. e…… sabemos que voce é assim mesmo

    parabens

  10. Me orgulho de ter uma amiga sincera como você.

  11. Como sempre…sabias palavras, amiga Amanda.
    Beijos
    Yara Gouveia

    • Seu porte, Amanda ,ê aristocrático e me remete à épocas mais refinadas, mas você redimiu a interessantíssima Amanda do século 19, de qualquer pecado que ela porventura tenha cometido . Nunca vi alguém tão carinhosa e generosa com seus empregados como vc, nem nunca vi empregados que oferecem um jantar no restaurante para os patrões como os seus oferecem pra vc e para o Dr Delboni , em agradecimento !)
      Portanto lá no céu onde Sinhá Amanda deve estar , ela tem muito orgulho de você…
      Ligia Kogos

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